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sexta-feira, 25 de setembro de 2009

CUCHULAINN PEGA ARMAS


Muitas das lendas irlandesas provêm de uma Cultura que remonta aos tempos pré-cristãos. Cultura essa que se manteve praticamente intacta pelo o fato dos Romanos nunca terem chegado a instalar-se na Irlanda e, consequentemente, o idioma
ali falado não ter sido afetado pelo Latim. Também uma forte tradição oral e a existência de várias escolas druídicas permitiam passar, intactos, de geração em geração, ensinamentos e conhecimentos.
Quando, a partir do século V, o Cristianismo chegou à ilha, os copistas monarcais registaram não apenas as Sagradas Escrituras como também as antigas histórias irlandesas que tão bem conheciam.
São quatro os diferentes grupos de histórias: o Ciclo Mitológico, o Ciclo do Ulster, o Ciclo Feniano e o Ciclo Histórico, ou dos Reis.
O Ciclo Mitológico (pré-cristão) conta a história de um povo de semi-deuses chamado Tuatha (povo) de Danaan* que combateu e venceu um outro povo de semidemonios, os Formorianos, que viviam nas ilhas que rodeavam a Irlanda.
Posteriormente, os Milesianos – os antepassados directos dos actuais irlandeses – derrotaram os Tuatha, os quais se refugiaram no mundo subterrâneo e que reaparecem à superfície sob a forma de fadas (fêmeas e machos) com poderes mágicos. A palavra irlandesa para “fada fêmea” é “bansi”, que veio a dar, em inglês, “banshee”.
As histórias do Ciclo do Ulster (norte da Irlanda), que data do tempo de Cristo, têm a ver principalmente com o grande rei Conor McNeasa e os seus valorosos Cavaleiros do Ramo Vermelho, o mais famoso dos quais é Cúchulainn.
O Ciclo Feniano, ou de Fianna, é posterior aos Cavaleiros do Ramo Vermelho em cerca de três séculos e conta a história de um grupo de guerreiros de elite que errava por toda a Irlanda.
Finalmente, o Ciclo Histórico, ou dos Reis, trata dos Grandes Reis de Tara, na
região central irlandesa de Conny Meath, prolongando-se no tempo até cerca do ano
1000.



*Segundo a Professora Laura Vasconcellos, em “Histórias da Mitologia Celta”,
Guimarães Editores, Lisboa, 2001, Tuatha de Dannan ou Povo de Dannan. Tuatha é a palavra gaélica para “povo” e Dannan é a Grande Deusa-Mãe da Irlanda, considerada a mais antiga deusa celta por alguns autores. A raiz “Dan” quer dizer “conhecimento”.



Cúchulainn pega armas



Quando ainda tinha apenas sete anos, Cúchulainn encontrava-se, um dia, a jogar hurling em Emain Macha enquanto, do outro lado do campo, se encontrava o Druida Cathbad dando as suas lições de magia a oito dos seus mais destacados alunos.
A certa altura, um deles perguntou ao Mestre quais os presságios, bons ou maus, destinados para aquele dia, ao que Cathbad respondeu:
– Aquele que hoje pegar em armas pela primeira vez será o mais valoroso
guerreiro que a Irlanda jamais teve, ou virá a ter, e, embora a sua vida venha a ser curta
e fugaz, as histórias das suas façanhas serão contadas e relembradas para todo o sempre!
Ao ouvir isto, Cúchulainn dirigiu-se ao Rei, seu tio, Conor MacNeasa e saudou-o:
– Toda a honra ao Rei!
– Essa é a saudação interessada de quem quer um favor – respondeu o Rei.
– Quero pegar em armas e tornar-me guerreiro – retorquiu Cúchulainn.
– E quem é que te colocou essas ideias na cabeça? – perguntou Conor MacNeasa.
– Cathbad, o Druida.
O Rei reflectiu durante alguns momentos e disse:
– Meu rapaz, por certo Cathbad não te daria falsos conselhos – e imediatamente deu
a Cúchlainn duas lanças, uma espada e um escudo.
O jovem treinou com aquelas armas até que se partiram, obrigando o Rei a dar-lhe
um outro conjunto de armas… que também se quebraram!
Catorze conjuntos de armas foram sendo sucessivamente destruídos até que Cúchulainn disse ao Rei:
– Estas armas não são suficientemente boas para mim! Dá-me armas que estejam à
altura das minhas capacidades.
Então o Rei entregou-lhe as suas próprias armas. Cúchulainn experimentou-as
dobrando a lâmina até que a ponta tocasse o punho, e a espada aguentou a pressão;
depois, abanou fortemente as lanças para testar a sua resistência, e elas mantiveram-se
firmes; e o mesmo sucedeu com o escudo. Por fim, Cúchulainn disse:
– Estas sim. Estas são armas dignas de mim!
Satisfeito, o Rei Conor mandou chamar Ibar, o Palafreneiro Real, e ordenou-lhe:
– Aparelha o meu carro de guerra com os meus dois melhores cavalos e deixa que
Cúchulainn se sirva dele.
Como ordenado pelo seu Rei, Ibar entregou a Cúchulainn o carro devidamente
preparado, mas o jovem, tal como fizera com as armas, também quis experimentar o
carro antes de o usar: agarrou-o pelo eixo, levantou-o, balanceou-o violentamente e deu-se
por satisfeito pois a estrutura tudo aguentou sem se desconjuntar.
Cúchulainn e Ibar subiram então para o carro e partiram em direção à torre fortaleza
de Ath na Foraine, junto à fronteira com a Terra de Slieve Fuad.
Pelo caminho, avistaram, na floresta, uns cisnes que, segundo Ibar, ninguém conseguia caçar, e se acaso o conseguia, não ia além de um único exemplar.
Sem dizer palavra, Cúchulainn apeou-se do carro, embrenhou-se na floresta em direcção às aves e regressou para grande espanto do palafreneiro, com vinte cisnes.
Prosseguiram viagem e quando, por fim, avistaram o forte, Cúchulainn perguntou:
– A quem pertence?
– Este é o forte dos três filhos de Nechtan, que foi morto pelos homens do Ulster –
replicou Ibar. – Ainda hoje os três filhos continuam a vangloriar-se de, naquele dia em
que mataram o seu pai, eles, por seu turno, terem deixado em campo mais homens do
Ulster mortos do que vivos os que conseguiram fugir.
– Então vamos lá! – sentenciou Cuchulainn sem hesitar.
– Estás doido?! – assustou-se Ibar. – Depois da morte do pai deles, qualquer
homem do Ulster que se atreva a ali ir não regressa vivo!
Ainda assim, Cúchulainn dirigiu-se ao forte e, sem hesitações disse-lhes que
estava ali para os matar! Os três irmãos largaram-se a rir ao verem um adversário ainda
tão criança.
Cúchulainn enrubesceu de raiva, atacou os três homens e matou cada um com um
único golpe de espada, decapitando-os. Depois, atou as cabeças ao carro e regressou a
Emain Macha onde, assim, granjeou a admiração e o respeito de todos os guerreiros
mais velhos.



NOTA:
O hurling é um jogo de equipe tradicional da Irlanda que existe, supostamente, desde tempos imemoriais e que consiste, basicamente, em jogar uma bola batendo-lhe com um bastão. Basebol,
hóquei (de campo, no gelo ou em patins) e críquete (ou ainda, mas com uma subtil diferença por a bola
ser lançada e não batida, a bola basca) são jogos que seguem padrões semelhantes pois todos requerem
bolas batidas com bastões ou stiques. A bola que é batida chama-se sliotar, é muito sólida (a palavra
deriva do gaélico sliabh, montanha, e thar, através de), pouco maior que uma bola de ténis e compõe-se de um enchimento de cortiça revestido por duas peças de couro fortemente costuradas. O stique do hurling denomina-se hurley e apresenta uma ponta espalmada e curva. Segundo a lenda, esta forma foi a adoptada
pois correspondia à do bastão tosco com que Setanta jogava.

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